Publicado em janeiro-fevereiro de 2022 - ano 63 - número 343 - pág.: 40-43
EPIFANIA DO SENHOR – 2 de janeiro
Por Ir. Izabel Patuzzo
Jesus, caminho de luz para a humanidade
I. INTRODUÇÃO GERAL
Nesta liturgia, a Igreja celebra a manifestação de Jesus como luz da humanidade. A festa da Epifania é a celebração do primeiro encontro de Jesus com os gentios, representados pelos magos vindos do Oriente. Segundo uma tradição que remonta aos primeiros séculos do cristianismo, cada um dos magos vinha de uma cultura diferente: Melchior da Ásia, Baltazar da Pérsia e Gaspar da Etiópia, representando as três raças conhecidas no mundo antigo. Dessa forma, simbolizam todas as nações fora do judaísmo. Eram por natureza adoradores de divindades, e Deus usa de seus conhecimentos culturais, de sua capacidade de ler os sinais nos astros dos céus, de suas habilidades de identificar as estrelas, para conduzi-los até seu Filho enviado. Antes de conhecer Jesus, os magos contemplam as estrelas, mas, com seu nascimento, eles passam a adorar o Deus verdadeiro.
Trata-se de sábios que interrogam com sabedoria onde se encontra o Rei que acabara de nascer. Eles perceberam os sinais nos céus; viram a estrela que apontou para algo extraordinário. O primeiro sinal de sabedoria foi interrogar sobre aquilo que desconheciam: onde estava o rei dos judeus, isto é, Jesus, para se prostrar diante dele e homenageá-lo. As Escrituras nos mostram que Deus sempre toma a iniciativa de revelar-se à humanidade. A revelação divina em Jesus Cristo é a final e definitiva. Herodes ignorava as Escrituras, por isso não saberia responder aos magos onde o Messias devia nascer. Enquanto aqueles buscam a verdade, Herodes opta por não se aproximar dela, mas permanecer na ignorância. Que a sabedoria dos magos nos inspire a buscar nas Escrituras os caminhos que nos conduzem até Jesus, para adorá-lo e segui-lo.
II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. I leitura (Is 60,1-6)
A primeira leitura, do livro do profeta Isaías, anuncia a chegada da luz salvadora do Senhor Deus. Essa luz será a alegria de Jerusalém e atrairá todas as nações para a cidade santa, que representa o povo escolhido, cuja missão é ser luz para o mundo. A leitura pertence à terceira parte do livro, denominado Trito-Isaías. Tais profecias retratam o período do pós-exílio, um tempo relativamente longo e difícil para Israel. O regresso dos exilados para Jerusalém foi uma experiência dolorosa, sobretudo pela situação devastadora do pós-guerra, com todas as consequências de um cenário de sofrimento tanto para os que permaneceram na terra como para os grupos de exilados.
É nesse contexto que o profeta dirige sua mensagem de encorajamento ao povo; com palavras de louvor e glória, apresenta Jerusalém como a cidade da luz, mostrando que, onde Deus habita, não há trevas. Implicitamente, o profeta faz um convite a Israel para se redimir e permitir que Deus habite em seu meio. A desolação das ruínas deixou a cidade vazia e escura, mas o tempo da humilhação passou. O povo aguarda a restauração, que vem da decisão de se aproximar de Deus novamente; de se deixar guiar por ele e reconstruir sua morada como sinal de renovação da Aliança. Inspirado na luz, o profeta anuncia a chegada salvadora de Deus, que dará à cidade um novo rosto. Deus é capaz de transformar a tristeza em alegria, a desolação em um lugar de bênção. Israel sempre será convidado a retomar a caminhada de fidelidade à Aliança e se deixar conduzir pela luz de Deus.
2. II leitura (Ef 3,2-3a.5-6)
A carta de Paulo aos cristãos de Éfeso foi escrita quando ele estava na prisão. O fato de estar prisioneiro, possivelmente em Cesareia ou Roma, não impede o apóstolo de acompanhar pastoralmente a comunidade dos fiéis. O conteúdo de sua mensagem reflete uma fé amadurecida no exercício do ministério de pregar a Palavra, de anunciar Jesus Cristo em meio a tantas adversidades. No texto da liturgia deste domingo, Paulo afirma que Deus tem um plano de salvação que inclui judeus e gentios. A vinda de Jesus Cristo rompeu com todas as barreiras de separação. O convite para abraçar a fé em Jesus se estende a todos. Assim, judeus e gentios se tornaram coerdeiros, membros de um mesmo Corpo e coparticipantes da mesma promessa de Deus.
O tema central da carta aos Efésios é o mistério do plano salvífico de Deus, estabelecido desde a eternidade, mas revelado, na sua plenitude, em Jesus Cristo. Esse mistério, que estava escondido, foi manifesto e realizado por Jesus, e comunicado aos apóstolos e sucessivamente a toda a Igreja. O mistério desvelado consiste na verdade de que todos aqueles que abraçam a fé em Jesus Cristo e se põem no caminho do discipulado alcançam a salvação. Esta não é exclusividade dos judeus, mas é destinada a todos os povos, sem exceção.
3. Evangelho (Mt 2,1-12)
Os magos vindos do Oriente, particularmente da Pérsia, não eram exatamente reis, mas uma casta sacerdotal, pessoas que exerciam função religiosa a serviço dos reis e do povo. Eram fiéis observadores das estrelas e tinham grande conhecimento de astronomia, pois acreditavam que as divindades habitavam nos céus e se manifestavam por meio de sinais. Os movimentos dos astros e estrelas no céu eram interpretados como formas de comunicação divina aos seres humanos, sinalizando eventos muito importantes. Assim, o brilho da luz que serviu de guia para os magos era muito visível e, ao se deixarem conduzir por essa luz, eles chegam até Jesus.
O evangelista Mateus insiste em situar geograficamente onde Jesus nasceu: Belém de Judá, segundo havia sido anunciado pelos profetas. O lugar do nascimento de Jesus coincide com a terra natal do rei Davi, para recordar que o Messias esperado virá restaurar o reino de paz que foi quebrado quando o povo perdeu o domínio do reino conquistado por Davi. Como, na comunidade de Mateus, talvez houvesse pessoas com dificuldade de reconhecer Jesus como Messias por ser de Nazaré, o evangelista deixa claro que ele nasceu em Belém de Judá, terra do rei Davi.
Os presentes oferecidos a Jesus – ouro, incenso e mirra – representam, respectivamente, sua realeza, sua divindade e sua passagem pela morte para nos alcançar a redenção. O ouro expressa que os magos reconhecem Jesus como o verdadeiro rei dos judeus; o incenso era reservado para os sacrifícios oferecidos a Deus. Na tradição do Antigo Testamento, o incenso é também símbolo de santidade e retidão. Dessa forma, Mateus elabora um texto catequético sobre Jesus já no início de seu relato; ao longo do Evangelho, as pessoas irão adotar duas atitudes básicas com relação a Jesus: acolhê-lo, como os magos, ou rejeitá-lo, como Herodes. Enquanto os magos se alegram porque encontram Jesus, Herodes fica profundamente perturbado. Mateus põe em evidência duas atitudes completamente opostas: a daqueles que se prostram diante do menino Jesus, reconhecendo sua realeza e divindade, e a de Herodes, que procura matá-lo. Desde seu nascimento, Jesus é apresentado por Mateus como o verdadeiro Messias enviado por Deus que, por um lado, será rejeitado por alguns de seu próprio povo, mas, por outro, será aceito e acolhido por muitos gentios.
III. PISTAS PARA REFLEXÃO
A festa da Epifania pode ser vista como nossa própria peregrinação, realizada durante uma vida inteira, em direção a Jesus, até nosso encontro real com ele, que deve transformar nossa vida. Essa solenidade nos convida a ver a nós mesmos como magos, como discípulos constantemente em movimento, que caminham na direção de Jesus, deixando-se conduzir por sua luz. O Evangelho deste dia nos diz que, na busca por encontrar Jesus, há muitos desafios: podemos encontrar aqueles que o acolhem e adoram, mas também aqueles que permanecem na indiferença e até no ódio e na violência. Em nossa caminhada de fé, encontramos grupos de pessoas com espírito destrutivo, como Herodes e seus companheiros; grupos indiferentes, como aqueles que apenas consultaram as Escrituras para saber onde Jesus devia nascer, mas não se interessaram em se encontrar com ele; e também grupos, representados no texto pelos magos, que vencem as distâncias, vêm ao encontro, oferecem seus presentes e adoram o Senhor.
Quais dons trago para oferecer a Jesus menino? Sou atento(a) aos sinais de Deus como os magos, que perceberam a estrela no céu com um brilho especial? Sou capaz de ler e interpretar os sinais de Deus em minha vida, nos acontecimentos da história e na sociedade? Sou capaz de me desacomodar, sair de minha zona de conforto, deixar as coisas às quais tenho tanto apego para ser livre e caminhar ao encontro de Jesus, assim como fizeram os magos?
Ir. Izabel Patuzzo
pertence à Congregação Missionárias da Imaculada – PIME. É assessora nacional da Comissão Episcopal Pastoral para a Animação Bíblico-Catequética da CNBB. Mestre em Aconselhamento Social pela South Australian University e em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É licenciada em Filosofia e Teologia pela Faculdade Nossa Senhora da Assunção, em São Paulo. E-mail: [email protected]