Roteiros homiléticos

Publicado em julho-agosto de 2024 - ano 65 - número 358 - pp.: 61-64

25 de agosto – 21º DOMINGO DO TEMPO COMUM

Por Pe. Marcus Mareano*

Qual é sua escolha de vida?

I. INTRODUÇÃO GERAL

O Tempo Comum vai avançando, e a Palavra de Deus instiga-nos a fazer escolhas na vida. Aos poucos, vamos percebendo coisas que não condizem com o que ouvimos ou caminhos que percorremos e não devem ser retomados. Somos seres de escolhas, e Deus nos ilumina para fazermos o melhor.

O texto de Josué conclama o povo de Israel para servir o Senhor. Jesus questiona seus seguidores sobre se querem continuar ou desistir do caminho, pois alguns achavam aqueles ensinamentos duros e difíceis. A carta aos Efésios apresenta o amor de Cristo como opção para as relações humanas. Assim, os textos da liturgia deste domingo nos proporcionam uma reflexão a respeito das opções que fazemos na vida. São, pois, muito propícios para concluir o mês vocacional.

Todos nós, servidores da comunidade de fé, temos nossas escolhas fundamentais na vida. Elas precisam ser sempre renovadas, rememoradas e reafirmadas. Nosso “sim” a Deus é para as pessoas, para melhor transmitirmos a fé, servindo o próximo.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. I leitura (Js 24,1-2a.15-17.18b)

O livro de Josué é pouco lido e conhecido por muitos de nós. Ele narra um momento importante da história do povo de Israel: a chegada à terra prometida por Deus e a conquista desse espaço. Josué é o sucessor de Moisés e o personagem de destaque do livro.

O trecho da primeira leitura se situa na parte final do enredo, quando o autor da obra elabora uma “despedida” do personagem Josué em forma de discurso. A cena se apresenta como uma assembleia entre os israelitas em Siquém, cidade-santuário das doze tribos, antes de celebrarem a renovação da aliança com Deus.

Os primeiros versículos (v. 1-2) localizam o leitor no evento. Era uma reunião de todas as tribos, juntamente com os anciãos, chefes, juízes e demais líderes. A liderança de Josué parecia soberana como a de Moisés, seu antecessor, porque ele falava, em nome de Deus, para todas essas pessoas reunidas. A Palavra de Deus era proclamada a fim de que o povo continuasse no propósito da aliança com Deus.

Um dos pecados mais graves do povo era a idolatria: trocar a fé no Deus único de Israel pelos deuses fabricados dos povos vizinhos. Desse modo, Josué propõe-lhes uma escolha, para decidirem a quem querem servir: aos deuses a quem alguns antepassados serviram ou ao Senhor Deus. Ele demonstra nitidamente sua opção fundamental: “eu e minha casa serviremos ao Senhor” (v. 15).

Movido pelo exemplo de Josué, o povo reage, igualmente aderindo à fé em Deus. A resposta do povo recorda os feitos divinos na sua história. Deus livrou seus pais da escravidão do Egito, realizou sinais maravilhosos diante das pessoas e guardou o povo com carinho e proteção. A memória de Israel confirma a fidelidade de Deus. Por conseguinte, o povo adere a Deus e se dispõe a servi-lo.

Em todo tempo, somos colocados diante de escolhas na vida. Josué não teme optar pelo serviço a Deus. O povo segue seu exemplo e adere à mesma escolha. Nós, que lemos e ouvimos, somos questionados sobre nossas escolhas e a quem servimos na vida. Renovemos nossa escolha pelo Senhor Deus.

2. II leitura (Ef 5,21-32)

Hoje acompanhamos, na liturgia dominical, o último trecho da leitura contínua que fazemos dessa carta. O tema da perícope são as novas relações em Cristo, principalmente as relações familiares.

O autor se dirige, primeiramente, aos que temem a Cristo (v. 21). Eles devem se submeter uns aos outros. Essa “submissão” pode ser entendida como disposição para servir, e o serviço deve ser a identidade cristã, conforme ensinou Jesus (Mc 8,35). Naquele tempo, a família possuía um único modelo, o patriarcal, centrado na figura do pai provedor de todas as coisas, e a mulher era bem adquirido para a procriação e o cuidado doméstico.

Segue-se uma comparação entre o amor de Cristo pela Igreja e o amor dos esposos. Assim, podemos entender em que sentido as mulheres devem ser submissas aos maridos (v. 22). Não é legitimação do machismo, mas uma comparação com a Igreja, comunidade de fé, que se empenha em servir a Cristo por amor. De igual modo, os maridos devem amar as esposas e se entregar por elas, a exemplo da entrega de amor de Cristo (v. 25). O paralelo que o autor estabelece é Cristo-marido e Igreja-esposa. A relação conjugal se assemelha à ligação de Cristo com a Igreja, uma esclarece a outra.

O amor de Cristo se demonstra na doação da vida realizada em seu ato salvífico. A terminologia é influenciada pelo ambiente litúrgico e cultual, reminiscências das práticas rituais para o batismo: a purificação com a água, a escuta da Palavra e a apresentação sem mancha e santa (v. 26-27).

Da mesma forma, os maridos devem amar suas esposas como a si próprios. Isso significa que a mulher possui a mesma dignidade e deve ser vista como parte do marido, como seu corpo e sua carne, e não como propriedade adquirida para uma função (v. 28-29). Percebemos uma interpretação do episódio da criação da mulher em Gn 2,21-24, por isso a citação direta de Gn 2,24 no v. 31.

Eis o grande mistério! O amor de Cristo pela sua Igreja se reflete no amor dos esposos. Com isso, caracteriza-se uma relação de doação e acolhida mútua. Ambos são chamados ao serviço, mais do que ao domínio. Devem preferir a entrega da vida a um fechamento egoísta.

A opção por amar realiza e gera felicidade. Se, na primeira leitura, era uma escolha por Deus em detrimento dos ídolos, aqui é uma escolha de amor e doação, como Cristo fez. Nossas escolhas de vida podem refletir esse grande mistério.

3. Evangelho (Jo 6,60-69)

Neste domingo também acompanhamos a última parte do discurso do “pão da vida” no Evangelho de João. Os efeitos do que Jesus ensinou refletem em seus ouvintes, principalmente nos discípulos.

Algumas pessoas acharam as palavras de Jesus difíceis demais para aceitar. Era uma novidade exigente! Jesus percebeu interiormente que estavam resmungando, como em Jo 6,41, porque ele ensinou a respeito do pão descido do céu. Mais assustados eles ficariam quando vissem o Filho do Homem subir para onde estava antes, para sua origem em Deus (v. 62). Como em outros momentos no discurso, os interlocutores não compreenderam o que Jesus falava.

O Espírito é quem vivifica e conduz à compreensão das palavras de Jesus (v. 63). No entanto, eles ainda eram carnais, fechados em si mesmos (Jo 3,6-8), e precisavam de conversão para assimilar o mistério apresentado por Jesus. As “duras” palavras de Jesus são inspiradas pelo espírito (sopro divino) e geram vida, porém a carne (os critérios humanos) não serve para interpretar o sinal dos pães e o apelo à conversão embutido nele.

Jesus pensava além da realidade e sabia que nem todos os que se diziam discípulos realmente acreditavam – o caso extremo era o de Judas. Desta maneira, os discípulos se encontravam diante da proposta de fazer uma escolha fundamental: aderir e converter-se ou recusar e continuar da mesma maneira. Por consequência, entre os que se diziam discípulos, muitos viraram as costas a Jesus e seguiram outro rumo (v. 66).

Jesus não se frustra com a desistência de alguns. Ele não precisa de multidão nem de fã-clube. Por conseguinte, corajosamente, dirige-se aos discípulos mais próximos e pergunta se não querem desistir (v. 67). Pedro, porta-voz do grupo como em Mc 8,29, responde, renovando a fé: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus” (v. 69). A escolha de Pedro e dos discípulos é continuar no seguimento de Jesus.

As palavras de Jesus instigavam e incomodavam quem as ouvia. Também é assim em nosso tempo. O Evangelho demonstra essa força que interpela, mas à qual nem todos correspondem. O incômodo é para que escolhamos e descubramos a vida eterna, renovando, a cada dia, a fé naquele que é o “Santo de Deus”.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

Encontramo-nos sempre diante de escolhas na vida. Sejam coisas simples, como escolher uma roupa, uma refeição ou um lugar para ir, sejam eleições mais complexas, como um estado de vida, uma profissão ou uma decisão que compromete a vida de muitos. Qualquer que seja a opção, é preciso ponderar, refletir, discernir e optar pelo melhor.

Josué propõe a fé em Deus em oposição à busca dos deuses dos outros povos. Efésios apresenta o amor de Cristo pela Igreja como modelo de amor entre os esposos e de outras relações humanas. No Evangelho, Jesus proporciona a seus seguidores a oportunidade de um discernimento: seguir suas palavras duras ou abandonar essa proposta. Hoje somos confrontados. Que escolhas precisamos fazer na vida?

Às vezes, precisamos deixar algumas coisas, alguns costumes, algumas atitudes. Outras vezes, precisamos buscar algo, agir em determinada direção ou mudar o rumo da vida. A liturgia propõe como critério a vontade do Senhor, seu amor, suas palavras de vida eterna. Quando encontramos essa beleza, podemos ir adiante.

A opção pelo que Deus inspira tira-nos do comodismo e desloca-nos para algo maior e melhor em nossa vida e na vida dos outros. Nem sempre temos tudo tão claro. Entretanto, se a convicção de fé nos faz perceber o apelo de Deus, podemos seguir em frente, pois em algum momento compreenderemos.

Pe. Marcus Mareano*

*é presbítero da arquidiocese de Belo Horizonte, doutor em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje) e pela Universidade Católica de Lovaina (KU Leuven). Professor de Bíblia em alguns seminários. No momento, desenvolve uma pesquisa de pós-doutorado na Universidade Católica de Lovaina (KU Leuven).