Roteiros homiléticos

Publicado em novembro-dezembro de 2022 - ano 63 - número 348 - pág.: 36-38

02 de novembro – Todos os Fiéis Defuntos

Por Izabel Patuzzo*

Habitar para sempre na tenda do Senhor

I. INTRODUÇÃO GERAL

Entre as certezas que carregamos em nossa vida de filhos e filhas de Deus está a finitude de nossa existência. Todos passamos pela experiência da partida definitiva de amigos e familiares para a eternidade. Tanto o nascimento como a morte fazem parte do ciclo da vida, da ordem natural. Segundo o ensinamento da Igreja, a morte é o fim de nossa missão na terra e a passagem para o ciclo final da existência, quando entramos na comunhão definitiva com Deus. Nossa caminhada terrena é medida pelo tempo, no decorrer do qual buscamos crescer e amadurecer na relação de amor com Deus e com aqueles com os quais convivemos. Nessa caminhada, envelhecemos, como acontece com todos os seres vivos da natureza, e a certeza da morte nos faz lembrar que nosso tempo aqui é limitado.

O sentido de urgência que esse tempo limitado desperta pode nos tornar conscientes, a cada dia, da importância de qualificar nossas relações familiares e de amizade, na busca de um trabalho digno e construtivo para nós e para os outros. E assim, atentos às necessidades dos que nos rodeiam, alcançar a plenitude de nossa vida espiritual. Que nossa passagem por este mundo seja um testemunho, uma contribuição à humanidade. Como cristãos, somos movidos pela fé na ressurreição, e nossa mortalidade futura deve nos inspirar a viver na expectativa de estar eternamente com Deus.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

1. I leitura (Sb 3,1-9)

O texto do livro da Sabedoria nos enche de confiança e nos ensina que Deus cuida de todas as pessoas que vivem segundo sua justiça. Ele não é indiferente ao sofrimento de quem cumpre seus ensinamentos. Sua graça e misericórdia se estendem a todos os que depositam nele sua confiança. A leitura nos apresenta uma vida futura feliz, na qual iremos experimentar a convivência com Deus; por isso, exorta-nos a viver na justiça. A pessoa sábia tem uma conduta virtuosa e confia em Deus; essas qualidades tornam possível a união com ele. Quem escolhe os caminhos do Senhor não está livre de sofrimentos e provações, mas quem espera nele compreenderá a verdade e o amor, pois somos chamados para a imortalidade. Por conseguinte, o autor sagrado afirma que a vida do justo está nas mãos de Deus. Os seres humanos são destinados à imortalidade, dom divino.

2. II leitura (Ap 21,1-5a.6b-7)

O tema central da segunda leitura é a descrição do mundo novo que Deus está para criar. A visão de João do novo céu e da nova terra remete à realidade de um mundo em que a violência, a maldade e a injustiça já não têm lugar. Desse modo, Deus pode estabelecer sua tenda no meio do povo, enxugar toda lágrima e eliminar todo sofrimento que aflige a humanidade. O primeiro céu e a primeira terra, que já passaram, simbolizam o mundo corrompido pelo pecado. Somente Deus é capaz de recriar o novo paraíso.

Sua voz, vinda do trono, fala diretamente com os fiéis ouvintes, afirmando que ele remove toda origem da tristeza e declarando que irá renovar o mundo. Esse texto encoraja os fiéis a considerar o poder e a confiabilidade de Deus. Aqueles que permanecerem fiéis a Jesus Cristo experimentarão a nova criação. O próprio Senhor declara que tudo está consumado; ele tem o poder de renovar todas as coisas, todas as pessoas e o coração de cada um, pois está no princípio e no fim de tudo que existe. Tem controle sobre a história e garante sua bênção aos vencedores, ou seja, a todas as pessoas que vivem segundo sua justiça. Estas não experimentarão a segunda morte, que, na linguagem do Apocalipse, significa a morte espiritual. Ser vencedor no caminho do discipulado é um desafio, pois exige uma vida inteira de fidelidade a Jesus Cristo e a capacidade de resistir a todas as propostas daqueles que se opõem aos ensinamentos das Escrituras.

3. Evangelho (Mt 5,1-12a)

O texto do Evangelho da liturgia deste dia faz parte do chamado sermão da montanha, segundo São Mateus. O discurso que Jesus dirige à multidão é uma atualização da Torá. De acordo com as Escrituras, pôr em prática os ensinamentos da Torá é caminho de santidade e sabedoria. Ela contém todas as instruções éticas e legais para uma vida vivida em conformidade com a justiça divina. Tais ensinamentos apontam para o amor a Deus com todo o coração. É a regra de ouro para toda pessoa que teme o Senhor.

Jesus atualiza a Torá para seu tempo, declarando que aqueles que vivem os preceitos divinos são bem-aventurados. As bem-aventuranças proclamadas por ele são uma exclamação de felicidade que acompanha a todos os que se põem sob os cuidados divinos, mesmo que sejam pobres, aflitos e perseguidos. Os pobres são felizes porque recebem o cuidado especial de Deus. O Senhor cuida daqueles que a sociedade ignora. A expressão “pobres em espírito”, em Mateus, expressa o afastamento das riquezas por opção pelo Reino de Deus.

Os mansos incluem todos os que são acolhedores, gentis e caridosos com os outros. Os aflitos referem-se a todas as categorias de pessoas que sofrem por verem que, muitas vezes, o mal reina sobre a terra. Os misericordiosos são aqueles que deixam transparecer o rosto misericordioso de Deus, vivendo uma vida de caridade e perdão. Os pacíficos representam os que excluem todo tipo de vingança e escolhem o caminho da não violência que Jesus ensinou.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

A fé na vida eterna nos ajuda a adotar um estilo de vida em conformidade com o projeto de salvação que o Senhor nos oferece. Esse projeto de salvação consiste em continuamente nos esforçarmos para crescer na justiça, na concretização do amor ao próximo, na construção de um mundo segundo os ensinamentos de Jesus, buscando não a sabedoria deste mundo, mas a sabedoria divina.

Os sofrimentos da existência presente não são um drama sem sentido e sem finalidade. A liturgia deste dia nos recorda que somos chamados a viver na esperança e na confiança; mesmo em meio a dores, cabe-nos caminhar em direção à vida plena que Deus nos oferece, em comunhão com ele e com todos aqueles que nos precederam nesse caminho.

A esperança da eternidade nos leva a viver comprometidos com a justiça e a verdade, pois nossa existência neste mundo deve consistir na busca do bem comum como caminho para a felicidade sem fim. Isso implica não nos conformarmos com os projetos terrenos que ameaçam a vida humana e a da natureza.

Abraçar a fé cristã significa viver na confiança em Deus, que nos oferece uma vida plena. Por isso, nossa tarefa é nos comprometermos com a luta pela paz e pela justiça, na certeza de que as forças do mal não podem pôr em risco a vida que nos anima. Na medida em que nos comprometermos com o mundo novo, adotando atitudes que protegem a vida, estaremos aptos para habitar o novo céu e a nova terra que o Senhor preparou para nós.

Izabel Patuzzo*

*pertence à Congregação Missionárias da Imaculada – PIME. Mestre em Aconselhamento Social pela South Australian University e em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É licenciada em Filosofia e Teologia pela Faculdade Nossa Senhora da Assunção, em São Paulo. Mestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica. E-mail: [email protected]