Caros leitores e leitoras,
Graça e paz!
Como fazemos todos os anos, a edição da Vida Pastoral de setembro-outubro é dedicada ao livro bíblico escolhido pela CNBB para aprofundamento no mês da Bíblia – neste ano, o Evangelho de Mateus. Conforme os artigos que seguem, vemos que nesse evangelho Jesus é apresentado como o Messias que realiza as promessas do Antigo Testamento e “toda a justiça” (Mt 3,15), indo além da costumeira interpretação feita pelos líderes religiosos de então. A comunidade de Mateus, formada predominantemente por judeo-cristãos empobrecidos, faz constantes referências a textos do Antigo Testamento para mostrar que a vida e a missão de Jesus têm profundas raízes no povo eleito.
As elites da época imaginavam um messias que reunisse traços de nacionalismo, legalismo, dominação sobre os outros povos e triunfalismo. Propagavam uma divindade, portanto, violenta e castigadora. A “justiça” ensinada por essas lideranças, entre as quais se incluíam os fariseus, consistia em uma observância mecânica da Lei. Isso implicava o rigoroso pagamento de taxas e impostos ao templo; práticas ritualistas que se resumiam às aparências; a lei do puro e do impuro; a “teologia da retribuição”, à luz da qual as pessoas ricas e saudáveis eram vistas como justas e recompensadas por Deus e as pessoas pobres eram consideradas como culpadas por suas desgraças. Muitos pobres não tinham condições e recursos para estar de acordo com as exigências religiosas.
Jesus faz uma interpretação da Lei bem diferente e acusa escribas e fariseus de transformá-la em mandamentos humanos a serviço dos grupos dirigentes. Ele afirma que não veio mudar a Lei, mas dar-lhe pleno cumprimento, e que a justiça a ser praticada precisaria superar a noção de justiça dos doutores da Lei (Mt 5,17-20). Ele não enfatiza os detalhes, o legalismo e as aparências, mas diz que é necessária a misericórdia (23,23); seu critério fundamental para a justiça é a solidariedade com os pobres, como mostra a cena do Juízo Final (25,31-46). Ele fez uma inversão no que os escribas pregavam e proclamou os pobres, então considerados “malditos”, como bem-aventurados. Jesus também ultrapassa as expectativas messiânicas reféns da forma distorcida de interpretação das promessas do Antigo Testamento. Por essas razões, foi condenado à cruz.
As pessoas que compunham a comunidade de Mateus – em contraposição às lideranças religiosas de então, que se consideravam o autêntico Israel – compreendiam-se como os verdadeiros continuadores das esperanças da Antiga Aliança. Por isso, entre outras coisas, a genealogia que apresentam remonta a Abraão e Moisés, mas contém pessoas excluídas. Elas insistem com firmeza que o Jesus morto na cruz, escândalo para os judeus fariseus, é o legítimo Messias, Emanuel – Deus conosco –, e o Mestre da lei baseada na justiça e na misericórdia. Ele é apresentado como o Messias dos excluídos. Por meio da palavra e da ação de Jesus, criticam a sociedade do império romano e dos judeus fariseus, fundamentada na opressão.
Atualmente persiste o problema da pobreza e da miséria em nosso país e no mundo, bem como persistem compreensões da pobreza como culpa dos pobres, como fruto de preguiça ou comodismo, e não de um sistema injusto e excludente. Também entre os que professam a fé cristã há muitos que pensam assim. Que a leitura e a compreensão do Evangelho de Mateus nos ajudem a nos solidarizar com os pobres e a ser firmes e coerentes na colaboração concreta, como cristãos, para a superação das injustiças sociais.
Pe. Jakson Alencar, ssp
Editor