Novembro-Dezembro de 2024
Prezadas irmãs, prezados irmãos, graça e paz!
A Lumen Gentium (LG) faz parte do conjunto dos dezesseis documentos promulgados pelo Concílio Vaticano II (1962-1965), evento que foi convocado pelo papa João XXIII e constitui um dos maiores e mais importantes marcos na história da Igreja no século XX.
O desafio dos padres conciliares, como canta a Aquarela do Brasil, de Ary Barroso, era o imperativo “abre a cortina do passado”. A cortina talvez tenha sido aberta, mas o olhar para o horizonte pede sempre maior contemplação, o que o Concílio denominou de “ler os sinais dos tempos”. Essa expressão, além da leitura em si, carrega a necessidade do discernimento, isto é, de tocar e escolher o cerne, ficar com a parte boa (Lc 10,38-42). A parte boa é o Evangelho, é Jesus mesmo, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós (Jo 1,14), assumiu nossa frágil condição humana, foi em tudo semelhante a nós, menos no pecado (Hb 4,15).
Os documentos do Concílio são classificados como constituições, declarações e decretos, conforme o tema e importância. A LG é uma constituição dogmática e, sem dúvida, uma das mais relevantes peças da totalidade do tesouro com que o Concílio nos brindou. Dogmática porque trata de questões de dogmas fundamentais da fé. Nesse caso, dos temas da eclesiologia, ou seja, da sua natureza e constituição, como instituição e como corpo místico de Cristo. Foi promulgada em 21 de novembro de 1964.
Após apresentar a Igreja como corpo místico de Cristo (LG 7), o documento a define como povo de Deus a caminho, sob a guia do Espírito Santo. É interessante notar o lugar de destaque que ocupa a categoria povo de Deus. O povo e a comunidade estão no centro. Aqui se verifica, por assim dizer, uma espécie de virada eclesiológica. Somente a partir dessa categoria-base é que se descrevem as funções dos bispos, dos presbíteros e dos religiosos. Trata-se de eclesiologia do serviço, e não dos privilégios.
A expressão “povo de Deus” foi e é motivo de muitos debates e até de brigas na Igreja. Há quem a evite e até quem, se pudesse, a excluiria do texto conciliar. Tudo isso, talvez, como fruto de outra eclesiologia, que se recusa a ter os olhos fixos em Jesus (Hb 12,2) e em seu Evangelho.
A insistência do papa Francisco por uma Igreja sinodal não é outra coisa senão uma forma de voltar ao que ensinou Jesus e o Concílio Vaticano II tão bem assinalou. As resistências ao papa Francisco, no que diz respeito à vivência sinodal eclesial, revelam o retrato de uma face clericalista, saudosista, dada às pompas e ao autoritarismo. O saudoso Pe. José Comblin, na introdução do livro Povo de Deus (Paulus), assim nos advertiu: “Não se trata apenas de voltar aos textos do Vaticano II como se esses textos fossem um ponto de chegada, pois o Concílio estava muito consciente de estar dando um primeiro passo para um grande processo de mudança. Sabia que era o início de grande virada na história da Igreja. Por isso importa, em primeiro lugar, partir da intenção profunda que percorre todo o processo conciliar”.
Quem sabe seja a hora de insistir na abertura da cortina do passado e aprofundar ainda mais os estudos, a meditação e a aplicação deste rico documento, a Lumen Gentium. Ao completar 60 anos, ela continua a apontar para o fundamental, Cristo. Nele estamos todos enxertados.
A equipe de Vida Pastoral deseja-lhe bom proveito deste material que preparamos para você.
Boa leitura!
Pe. Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp
Editor