Caros leitores e leitoras,
Graça e paz!
“A Igreja católica não é um museu de arqueologia. É a antiga fonte do lugar que dá água às gerações de hoje, como a deu no passado”, dizia-nos sabiamente o papa João XXIII. Observamos nas fases da história e da evolução da humanidade as enormes mutações ocorridas. Em comparação com o tempo e a cultura em que Jesus viveu, e mesmo com o período em que João XXIII proferiu a frase acima, temos uma realidade bastante diferente. Portanto, em primeiro lugar, ao olhar a história, sentimo-nos gratos pelos que nos precederam na fé e, entre percalços e avanços, conseguiram transmitir o evangelho que receberam de maneira a continuar fazendo sentido aos que vieram depois. Em segundo lugar, isso nos estimula ao compromisso de continuar atualizando essa fé, fazendo-a viva e operante para as novas gerações.
O cuidado de conhecer as mutações civilizacionais e encontrar formas de “traduzir” o evangelho e encarná-lo na realidade e de atualizar a Igreja e sua ação evangelizadora para o mundo de hoje não significa jogar fora a tradição, mas, ao contrário, ser mais fiel a ela, fazendo que se mantenha como fonte viva e vivificadora, e não como um conjunto de peças de museu ou apego saudosista ao passado. Diante das mudanças culturais, a força do evangelho e da ação evangelizadora não está em impor verdades prontas, frias e petrificadas, mas, no diálogo com a cultura, ajudar as pessoas a se nortear segundo aquilo que Jesus ensinou e segundo a rica tradição espiritual que herdamos.
Com muita frequência escutamos dizer que o mundo e a Igreja estão em crise. O ser humano atual se sente desenraizado, seja das tradições, seja dos ideais elevados norteadores, o que gera vazio, carência de sentido da vida, ansiedades de todo tipo. As grandes utopias e certezas perderam força; há excesso de informação, diante da qual há dificuldade de orientação e escolhas adequadas; perdeu-se em medida considerável o valor da durabilidade, da constância, do compromisso e, por conseguinte, também dos ideais religiosos. Há também certa decepção com as promessas da modernidade e da racionalidade moderna, que alimentaram o ideal da solução de todos os problemas, mas, além de não alcançá-lo, geraram alguns novos entraves, como sucessivas guerras e a criação de tecnologias armamentistas que podem devastar o mundo inteiro; não só a permanência, mas o aumento da pobreza e da exploração; contínuas crises econômicas; a destruição da natureza, entre outros.
Os artigos a seguir analisam algumas dessas mutações culturais, no esforço de dar respostas cristãs a tais questões e encontrar caminhos de renovação do sentido do evangelho e do Reino de Deus diante de tais realidades. Em contextos de crises e mudanças aceleradas, ideias guias, norteadoras, são bem-vindas. A fé cristã tem muito a contribuir nessa realidade. Para isso, é preciso compreender bem os sinais dos tempos; desfazer os mal-entendidos que levam boa parte das pessoas a opor realização pessoal e social à fé e à Igreja e, vice-versa, mal-entendidos que possam situar a Igreja e a revelação de Deus em oposição à realização humana; traduzir a fé cristã para o mundo de hoje, ajudando as pessoas a encontrar nela um sentido maior para a existência e renovada força vivificadora e transformadora.
Pe. Jakson Alencar, ssp
Editor