Prezadas irmãs, prezados irmãos, graça e paz!
A canonização de Irmã Dulce, em 13 de outubro de 2019, foi um precioso presente para os fiéis católicos. Doravante a pequena e humilde baiana pode ser invocada pelo nome de Santa Dulce dos Pobres. O nome Dulce lembra doçura. Aquela doçura que os corações bondosos sabem espalhar na vida dos próximos, mesmo tendo uma vida marcada por sofrimentos. Como bem disse D. Helder, “há criaturas como a cana: mesmo postas na moenda, esmagadas de todo, reduzidas a bagaço, só sabem dar doçura”. Dulce foi doçura na vida difícil imposta a tantos irmãos deixados à beira do caminho (cf. Mc 10,46-52). Ela percebeu, desde cedo, que a vida só tinha sentido quando permeada de ternura. E foi o que ela fez: abraçar com ternura os pobres e indesejados, os sem endereço da cidade de Salvador, Bahia.
Dulce foi uma mulher nordestina que não tinha medo do lugar dos conflitos, a rua. Carregava no coração, no olhar e nos gestos os mesmos traços de Jesus Cristo. Havia em seu peito a chama do bem, da compaixão, da urgência para o cuidado. O corpo franzino, em passos suaves, andava na contramão das grandezas do mundo. Toda a vida doada no serviço aos irmãos excluídos, transformados em sobras, “resíduos” (EG 53). Os olhos iluminados de Dulce miravam o invisível, o profundo: Deus mesmo. Ela ensinou o que é ser discípula pelo exemplo, e não só por palavras.
Conta-se que, certa vez, Dulce foi pedir ajuda a um homem rico de Salvador, para socorrer a multidão de pobres que sempre lhe acorria em busca de alívio para o fardo da fome, da indigência e, principalmente, da indiferença. A freira, ao fazer o pedido e estender a mão, teria recebido uma cusparada na mão. Diante da humilhação, Dulce estendeu a outra mão e disse: “Tudo bem, a cusparada é para mim, e a ajuda para meus pobres?”. O gesto de Dulce é uma lição de bondade que desarma a arrogância, um apelo por justiça: fazer justiça aos pobres.
O tema de capa desta edição de Vida Pastoral tem a ver com a bondade, o outro nome do amor, abordagem que emana do tema da Campanha da Fraternidade deste ano: “Fraternidade e vida: dom e compromisso”, sintonizado com a frase bíblica: “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele”, texto recolhido da parábola do bom samaritano (Lc 10,33-34).
Para colaborar com nossa reflexão, Dom Joel Portella Amado apresenta, em seu artigo, a importância da CF-2020, com o tema sobre a vida, e chama a atenção para o risco da cultura de morte que se implanta entre nós. Recorda que a indiferença é uma forma pecaminosa de pacto com a morte. Nesse sentido, Antonio Carlos Frizzo amplia o tema numa perspectiva antropológica, partindo do estudo bíblico sobre o gênero parábola, especificamente a do bom samaritano, e propõe-nos uma ética solidária. Miguel Debiasi, por sua vez, apresenta uma metodologia pastoral em diálogo com José Comblin, no contexto latino-americano, visando a uma ação para transformação e libertação das pessoas. Por fim, Jaldemir Vitório oferece-nos profundo estudo sobre a teologia do Evangelho de Mateus, o que nos ajudará a melhor usufruir do Ano A do ciclo litúrgico. Contamos ainda com os roteiros homiléticos, desta vez preparados por Luiz Alexandre Solano Rossi.
Que tudo concorra para o bem e para a compaixão, verdadeiros antídotos contra a indiferença.
Boa leitura!
Pe. Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp
Editor