Graça e Paz!
Deus viu que tudo o que ele fez era bom (Gn1,10). Na Campanha da Fraternidade ecumênica deste ano, somos convidados a uma reflexão sobre economia e vida. Os bens da criação, como diz o Gênesis, são bons, são dádivas de Deus para todos. Não pensemos que criticar a economia hegemônica na atualidade, marcada pela injustiça, implique a rejeição ingênua de tais bens. Na espiritualidade cristã, o desapego ao material e a abertura ao transcendente são aspectos centrais, mas isso não significa negar os bens da criação. A vida e sua realização envolvem a economia. A questão é saber orientá-la com justiça e retidão.
Na narrativa bíblica da criação, Deus cria um jardim com tudo o que é necessário para a realização da vida. Essa narrativa não tinha nem tem a pretensão de ser História, na concepção positivista desta disciplina surgida vários séculos depois. Trata-se de uma narrativa simbólica que possui uma verdade mais profunda que a da história positivista e das reportagens jornalísticas. As pessoas de então, à luz de sua fé em Deus, procuraram compreender a realidade e seus problemas, e assim, com base nessa reflexão e na experiência, surge a narrativa simbólica. Como nós hoje também podemos ver, o mundo tem tudo para ser um paraíso; entretanto, por causa das opções feitas pelas pessoas e pelas sociedades, a possibilidade de uma vida assim harmoniosa é reprimida. Por exemplo, milhões de pessoas passam fome, enquanto outras consomem exagerada ou compulsivamente.
A posse dos bens de maneira desequilibrada é reflexo da transformação do dinheiro e do mercado em ídolos, que tomam o lugar do Deus da vida. E esses ídolos, como todos os outros, exigem sacrifícios. Os sacrificados a eles são, por exemplo, os que morrem de fome; as crianças que, na China, na Índia e em tantos outros lugares, trabalham de 10 a 12 horas diárias por 0,30 dólares por hora para produzir tênis, cigarros e outras mercadorias vendidas a preços exorbitantes nos mais chiques shopping centers do planeta. Quando se nega o transcendente absoluto que é Deus ou não se consegue viver em sintonia com ele, cai-se na absolutização das coisas contingentes. E depositar confiança absoluta em coisas transitórias leva ao fracasso e à decepção. Conforme afirma o filósofo Gilles Lipovetsky, vivemos na sociedade da decepção, onde impera o mal-estar, a angústia, as depressões. E – podemos acrescentar – as crises econômicas cada vez mais profundas.
Por isso tudo, foi muito oportuna a escolha do tema da Campanha da Fraternidade de 2010, que nos dá a possibilidade de fazer uma crítica às injustiças e desequilíbrios econômicos atuais, mas também valorizar e reforçar o que de novo e de bom tem surgido e se desenvolvido em proveito de uma economia solidária e mais justa, tanto em âmbito local como nacional e internacional. Nesse sentido se destacam a união dos países do sul (mais pobres) para fazer frente, nos fóruns e tratados internacionais, aos países do norte (mais ricos), as inúmeras iniciativas de cooperativas de trabalhadores surgidas no Brasil, a maior integração dos países da América Latina e a diminuição da desigualdade social em nosso país.
Jakson Ferreira de Alencar, ssp
Editor