Carta do editor

Julho-Agosto de 2023

15º Intereclesial das Cebs:
Igreja em saída, na busca da vida plena para todos e todas

Prezadas irmãs, prezados irmãos, graça e paz!

Deveria ter 7 ou 8 anos quando a animadora da comunidade, dona Rimar, me pegou pela mão e me conduziu pela sala da casa do tio Pedro para saudar a todos, no momento do abraço da paz, na celebração do “Dia do Senhor”. Mais tarde, iria gaguejar na primeira prece que faria em voz alta e em público. A palavra “solidariedade” era longa demais para quem ainda estava se familiarizando com as letras. O exercício da solidariedade também é colaborar para que alguém consiga dizer sua palavra. Animaram-me a pronunciar SO-LI-DA-RI-E-DA-DE. Inesquecível.

A celebração dominical, o “Dia do Senhor”, constituía um momento especial de oração e de encontro das famílias em nosso povoado rural, Sítio Angico, em Quixelô, sertão do Ceará. Ali no nosso lugarejo, ambiente dos primeiros afetos familiares e comunitários, o mundo telúrico enchia nossos olhos de esperança, embora nosso lugar “nem estivesse no mapa”, como às vezes costumávamos brincar.

Menino tímido, senti-me querido demais com aquele gesto. Foi tão marcante, que jamais o esqueci. Os afetos tatuam nossa alma. Não tenho dúvidas de que naquele dia, em meu coração de primeira infância, foi plantada uma semente, como aquela semente de mostarda do Evangelho (Mt 17,20), discreta e generosa como são as coisas de Deus.

Nas celebrações, os benditos, no vozerio geral de crianças, jovens e idosos, faziam-se ouvir de longe: “Vejo no mundo tanta coisa errada, a gente pensa em desanimar. Mas quem tem fé sempre está com Cristo, tem esperança e força pra lutar”.

Hoje percebo que, naquele dia, vivi minha primeira experiência na comunidade eclesial de base (CEB). Uma das principais características de uma CEB é a acolhida, o afeto.

E por falar em afeto, recordo o saudoso Pe. João Firmino da Cruz (in memoriam), pároco de Bom Jesus Piedoso de Quixelô, que se misturava em meio aos jovens da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP). A casa paroquial tinha as portas abertas. O chá de cidreira e o pão com manteiga, como não lembrar e não ficar com água na boca!

Pe. João e sua velha picape C10 eram inconfundíveis. Ouvíamos de longe o ronco do motor. Naquele dia haveria missa. O velho carro e o animado padre percorriam as estradas empoeiradas ou enlameadas e quase todas esburacadas nos rincões da sua extensa paróquia. Era difícil não ultrapassar o limite de lotação, porque havia sempre espaço para uma carona. A sorte dele foi que conseguiu articular uma equipe de animadores leigos, jovens e adultos, fazendo valer o projeto pastoral paroquial. As assembleias paroquiais eram bonitas de ver. Salão cheio. Pessoas animadas, trabalhos em grupos e plenárias participativas.

Aprendi muitas coisas da vida e da fé na comunidade de base. Além da espiritualidade, tínhamos a possibilidade de cultivar os vínculos e o sentido de pertença ao grupo, bem como aguçar o senso de responsabilidade social. Atrevíamo-nos até a fazer leitura de conjuntura.

Por isso, é uma alegria entregar a você este número de Vida Pastoral, com o assunto de capa do 15º Intereclesial de CEBs. Ainda temos muito a aprender com a experiência das CEBs, imbuída da sabedoria dos simples, da fé e da cultura populares, da capacidade de pensamento crítico e, sobretudo, da centralidade da Palavra de Deus.

Que o Espírito Santo nos anime a pegar na mão das irmãs e dos irmãos e, desde já, fazermos a experiência do céu.

Boa leitura!

Pe. Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp
Editor