Carta do editor

julho-agosto de 2014

Homoafetividade e fé cristã

Caros leitores e leitoras,

Graça e paz!

É comum, em ambientes religiosos, ouvirmos dizer que sobre alguns temas de ética da sexualidade é preferível silenciar, para evitar polêmicas. Por isso, publicar uma edição de Vida Pastoral sobre a temática da fé cristã ante a homoafetividade foi motivo de bastante reflexão prévia. O objetivo da edição não é polemizar, mas oferecer subsídios para melhor compreensão da questão e favorecer o atendimento de necessidades pastorais. Se, por um lado, houve de fato problemas entre a hierarquia e teólogos morais no passado recente – o que não significa que não haja excelentes reflexões dos moralistas católicos –, por outro, tem havido constante esforço, seja por parte da Santa Sé, seja por parte de muitos pastores do povo de Deus, no sentido de compreender e abordar adequadamente questões de sexualidade e de homoafetividade que interpelam os cristãos atualmente, como atesta Pe. Edênio Valle em seu artigo. Certas posturas extremadas geralmente revelam desconhecimento do que a Igreja diz oficialmentesobre ética da sexualidade. Por vezes, limitam-se a repetir superficialidades e generalizações publicadas pelos meios de comunicação ou pelo senso comum.

Já em 1976, uma carta da Congregação para a Doutrina da Fé (Declaração sobre alguns pontos de ética sexual)afirmava: “Indubitavelmente essas pessoas homossexuais devem ser acolhidas, na ação pastoral, com compreensão e devem ser apoiadas na esperança de superar suas dificuldades pessoais e sua inadaptação social. Também sua culpabilidade deve ser julgada com prudência”. Outra carta da mesma congregação, do ano de 1986 (Carta aos bispos sobre o atendimento pastoral das pessoas homossexuais), afirma que nenhum ser humano é mero homo ou heterossexual, mas é, acima de tudo, criatura de Deus e destinatário de sua graça, que o torna filho seu e herdeiro da vida eterna (n. 16). A posição da moral católica deve se basear na razão humana iluminada pela fé e encontrar apoio também nos resultados seguros das ciências humanas (n.2). Toda violência física ou verbal contra pessoas homossexuais é deplorável, merecendo a condenação dos pastores da Igreja onde quer que se verifique (n. 10).

É verdade que, em temas complexos, convém ter prudência. Entretanto, silenciar a respeito do assunto pode significar omissão, seja em relação às pessoas e às famílias que necessitam de orientação, seja em relação à própria Igreja, que tem o desejo e a missão de auxiliar os seres humanos em suas necessidades, ouvindo seus apelos e anseios. Amar a Igreja é também ajudá-la em seu esforço de dialogar com as necessidades atuais, com as ciências sociais, humanas e biológicas, fazendo progredir sua tradição.

Qualquer um que tenha contato pastoral com o público católico ou esteja atento a notícias sobre violência contra homossexuais, casos de homicídios e de suicídios, afastamentos e incompreensões mútuas entre a Igreja e as pessoas homossexuais sabe quanto é importante compreendermos bem a questão.

Educar as pessoas para a boa vivência da ética cristã em todas as dimensões, não apenas na sexualidade, é muito mais do que pôr ênfase em condenações, culpas e medos. Como nos lembra o papa Francisco, o ponto de partida do ensinamento cristão deve ser o seu elemento positivo que é boa notícia (evangelho). Para ele, a prioridade da pregação deve ser curar todo tipo de ferida e “o anúncio do amor salvífico de Deus precede a obrigação moral e religiosa. Hoje, por vezes, parece que prevalece a ordem inversa”.

Pe. Jakson Alencar, ssp

Editor