Prezadas irmãs, prezados irmãos, graça e paz!
A esperança é o olhar de mulher grávida no silêncio da madrugada. Um olhar entre o limiar do medo da dor do parto e a alegria de dar à luz. Luz que rompe a escuridão da noite e sorri no clarão da aurora. Luz que manda embora o medo. Mamãe, dona Mirian, mulher de muitos partos, sempre diz que a dor do parto é inexplicável, de tão dolorosa; contudo, ao ter no colo aquela vidinha tão frágil, que chega ao mundo chorando, o primeiro abraço, a primeira amamentação são uma espécie de eternidade.
O apóstolo Paulo usa a imagem do parto para falar de uma realidade cósmica que anseia por libertação e espera um futuro feliz para toda a criação. “Sabemos que a criação inteira geme e sofre até agora com dores de parto” (Rm 8,22). Os gemidos da criação são também os gemidos da humanidade, porque tudo que Deus criou está interligado e tudo o que ele fez é bom. Jesus veio resgatar a bondade do mundo: “Não vim para condenar o mundo, mas para salvar o mundo” (Jo 12,47). Nisso consiste também a esperança. O mundo tem futuro, apesar de todos os cenários nada promissores.
Atravessamos o doloroso período pandêmico da Covid-19, de 11 de março de 2020 a 5 de maio de 2023; carregamos em nós suas sequelas, na saúde mental e física, bem como as consequências econômicas, sociais e culturais. Se a humanidade vivia em crise, a Covid-19 escancarou-a ainda mais. Clama aos céus a crise humanitária, expressa na realidade de tantos irmãos que sobrevivem ao relento da rua. Essa realidade não decorre da falta de recursos materiais. Nunca se produziu tanta riqueza quanto agora. Todos temos necessidade de encontrar nosso lugar no mundo e nos sentirmos em casa nele. Ocorre que, no mundo todo, há uma distância abissal que separa os miseráveis dos super-ricos. Bastaria breve contemplação das paisagens das cidades mais poderosas do mundo para notar a ostentação do luxo nos arranha-céus e suas fachadas, em contraste com os trapos humanos perambulando feito zumbis nas ruas e guetos de fronteiras invisíveis.
Como se não bastasse, os líderes dos países mais poderosos do mundo não se entendem e as guerras se instalam, ceifando vidas, principalmente de jovens e crianças. Os velhos encarquilhados no mal criam guerras, mas são os jovens que vão para o fronte lutar por aquilo com que eles nunca sonharam. Além disso, a humanidade tem convivido, cada vez mais, com eventos climáticos extremos: secas e enchentes, frio e calor, incêndios sem precedentes. Diante de tudo isso, a criação realmente geme em dores de parto. “Gememos interiormente, esperando ansiosos a redenção de nosso corpo. Pois na esperança já fomos salvos” (Rm 12,23-24). Essa espera quer dizer esperançar, caminhar juntos. Nosso desafio é olhar o horizonte com esperança de futuro bom.
A esperança é como um olhar de sertanejo para o horizonte em tempos longos de estiagem. Recordo-me dos muitos olhares de papai, senhor Antônio (in memoriam), o Cabeça, como era conhecido. Do alpendre de casa, olhava para o nascente com os olhos semicerrados, por causa de sua vista já turva. Seu olhar procurava algum sinal de relâmpago no horizonte. Ao ver o sinal, nem que fosse um pequeno relampejar, anunciava que brevemente choveria. E chovia.
O Jubileu de Esperança é um convite a olharmos para o horizonte, na penumbra da realidade histórica conturbada, afinal, cada ser humano carrega em seu bojo a finalidade definitiva e o horizonte derradeiro ao qual se direciona. Jesus é nosso horizonte. Ele é o futuro que advém continuamente ao presente concreto e estreito do ser humano e do universo. Essa é a esperança que aponta para o horizonte. “E a esperança não decepciona, pois o amor de Deus foi derramado em nossos corações” (Rm 8,5). Nessa esperança haverá um novo parto, um mundo novo.
Boa leitura.
Pe. Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp
Editor