Carta do editor

janeiro-fevereiro de 2016

Temas Sociais

Caros leitores e leitoras,

Graça e paz!

O lema da Campanha da Fraternidade deste ano, “Quero ver o direito brotar como fonte e correr a justiça qual riacho que não seca” (Am 5,24), e o tema, “Casa comum, nossa responsabilidade”, focando principalmente o saneamento básico, apontam para a ecologia integral e não a meramente ambiental. Estão em sintonia com a encíclica do papa Francisco Laudato Si, que também propõe uma abordagem ecológica integral: todas as coisas e seres do mundo como realidades inter-relacionadas, formando um grande todo. Não se pode falar de ecologia ambiental adequadamente sem falar de ecologia humana, de economia, de justiça social, de ética. Como lembra o papa na encíclica, “o grito da terra é também o grito dos pobres”. Com efeito, quando não se cuida do todo e não se cuida do meio ambiente, quem mais sofre as consequências são os mais vulneráveis, os pobres. É o que demonstra também a Campanha da Fraternidade, ao tratar da falta de saneamento e suas consequências, entre as quais as doenças.

            A rica expressão do profeta Amós escolhida para o lema surgiu num contexto de muita religiosidade e pouca justiça social. O profeta adverte que cultos com esplêndidas liturgias, mas desligados da justiça e até servindo para disfarçar e desculpar ou ocultar injustiças, opressões e egoísmo, são rejeitados e detestados por Deus.

A degradação da “casa comum” é decorrente da ganância desmedida, da injustiça, da voracidade produtivista e consumista, as quais não só retiram da natureza mais do que é necessário para viver e do que ela pode dar, como também produzem lixo e poluição que a destroem. A degradação humana, a degradação ética e a degradação ecológica estão intimamente ligadas.

Para apaziguar a consciência, investe-se fortemente num discurso ecológico, da “sustentabilidade” ou do “desenvolvimento sustentável” superficial e paliativo, que não muda em nada essa engrenagem econômica perversa. Por um lado, são realizadas ações pontuais e inócuas a favor da natureza; por outro, ela é destruída, havendo até mesmo o uso do discurso da “sustentabilidade” como forma de marketing, para vender todo tipo de produtos supostamente ecológicos ou para melhorar a imagem de empresas predatórias. Esse discurso da sustentabilidade, ao invés de incentivar a redução do consumo, fomenta-o. Compulsivamente são comprados produtos que, no ato da compra, já se tornam obsoletos, sendo essa obsolescência muitas vezes definida por algumas pequenas mudanças nos objetos. Basta que os produtos sejam supostamente “verdes” para que as pessoas se sintam desresponsabilizadas pelo consumismo e pelo descarte. Ao mesmo tempo, retira-se da ideia de “sustentabilidade” tudo que signifique renúncia, restando uma superficialidade hedonista, indolor e celebrativa. Esse tipo de discurso e atitude é similar à forma de religiosidade denunciada pelo profeta Amós.

O tema do cuidado da casa comum, em sintonia com a profecia de Amós sobre a relação entre religião e justiça social, constitui forte apelo de conversão neste período quaresmal. Ambos, tema e profecia, estimulam-nos a não cair no discurso ambiental superficial. Essa conversão quaresmal, para ser verdadeira, precisa ser capaz de renúncias (e não meramente de jejum); de solidariedade (e não meramente de esmola); de mudanças na lógica de morte de um sistema econômico destrutivo (e não meramente de oração descomprometida).

Pe. Jakson Alencar, ssp

Editor