Artigos

Publicado em número 220 - (pp. 22-26)

“Tempo é dinheiro” E outras questões para a catequese com adultos

Por Maria Paula Rodrigues

Um casal de noivos procura o matrimônio. O noivo não é batizado e declara seu desinteresse de vir a sê-lo. Ao ser informado de que seria necessário um processo especial, diz: “Processo? Não, deixa pra lá. Eu me batizo. É mais rápido, não é?”

 

Um casal “católico” vem se aconselhar. Muitas vezes ouviram em palestras e em “pregações eletrônicas” a severa advertência contra métodos contraceptivos e em favor de um “casamento casto”. Não podem ter mais um filho no momento, pois estão desempregados. Também não suportam viver juntos sem sexo. E querem agradar ao Senhor Jesus oferecendo a “pureza” de seus corpos. Como resolver todas essas questões ao mesmo tempo? A única alternativa viável seria a separação?

 

Poderíamos, eu e você, citar uma infinidade de casos de adultos perdidos diante das contradições — muitas vezes falsas — da vivência cotidiana da fé. Nem sempre falta-lhes a catequese. Quase sempre, porém, falta uma catequese madura, adequada às suas mais profundas necessidades e desejos. O problema surge no processo de adequação.

Quais os critérios a serem seguidos?

Serão os critérios do mercado? É preciso agradar a todo custo, oferecendo o que o “cliente” quer, o quanto quer, e somente pelo tempo que lhe interessar?

Serão os critérios da cristandade neotridentina? Agarrar o catequizando a todo custo, entulhar sua cabeça de cultura religiosa, queira ou não, antes que outros o façam?

Uma catequese doutrinadora, divorciada da vida, reduzida ao imaginário da criança e a uma compreensão estática do mundo tem tudo para afastar o adulto de uma fé autêntica. A fé inconsciente no deus-dinheiro, por outro lado, cria obstáculos para a fé no Deus de Jesus. E um conjunto de mal-entendidos, deixado por certas (tele)catequeses de caráter apologético, só cria barreiras — estas realmente perigosas, porque travestidas de rigor moral e de piedade ao despertar religioso do adulto.

Delinear alguns aspectos desse quadro é uma exigência. Isso significa desproblematizar situações que não passam de sintomas dos problemas reais e redirecionar o exame a questões de fundo.

 

1. Problemas que não são problemas

Para amplos setores eclesiais, entre os maiores desafios à catequese com adultos teríamos: o relativismo moral, especialmente no plano da sexualidade e da vida familiar; a persistente autonomia em relação ao clero, especialmente por parte dos setores populares; a religiosidade da Nova Era, que se manifesta no consumo de um caldo misto de oráculos e símbolos de diversas culturas religiosas; a religiosidade popular, tida como inferior; o êxodo de católicos nominais a Igrejas (neo)pentecostais.

Num primeiro olhar, talvez não se perceba que a angústia do poder ameaçado perpassa a preocupação com esses elementos. Não seria difícil imaginar uma voz nas entrelinhas dizendo: “Eles não me perguntam mais o que devem fazer; resolvem por si mesmos ou procuram a orientação de outros”. Trata-se, por parte de tais setores eclesiais, da ansiedade de se fazer ouvir novamente, de resgatar a confiança absoluta que pensavam ter num passado recente. Aí reside um sonho: a recuperação do prestígio e da autoridade moral da Igreja. O instrumento para sua realização? A catequese para adultos.

Porém, os adultos “descritos” acima não estão pedindo catequese. Já encontraram outros caminhos de realização. A proposta do evangelho foi mal compreendida ou chegou tarde. Sinal de que o problema não está neles, mas sim numa deficiente ação evangelizadora da Igreja.

Em vez de tomar tais elementos como problemas a resolver, a catequese deve considerá-los dados da realidade religiosa e moral de adultos. Deve perguntar-se pelo que verdadeiramente toca esses adultos no que têm de mais íntimo. E deslocar a preocupação fundante: da angústia do poder ameaçado ao desejo de compartilhar eficazmente a experiência radical de salvação em Jesus. Pois a preocupação da catequese não é jurídica, é pastoral. Não tem a pretensão de tirar o adulto do “erro”. Sua pretensão é levá-lo ao melhor caminho possível, à vida em plenitude. Catequese, no sentido profundo, quer dizer ecoar a Palavra para formar comunidades, em vista do Reino.

 

2. Os “problemas” indicam a solução

Os dados acima arrolados nada mais são do que o mapa do tesouro: abrem-nos os olhos para compreender que tais homens e mulheres estão em busca espiritual. Aqui entramos no fascinante campo do desejo de Deus.

Em seu âmago, aí se encontra uma carência sem nome, sem objeto definido. Apenas pressente-se o vazio assustador — “Eu sei que a vida podia ser bem melhor, e será” (Gonzaguinha). “Todo mundo tem um vazio no peito, e esse vazio tem o formato de um homem, e esse homem se chama Jesus Cristo”. — A poesia e a pregação sabem dar voz a essa realidade profunda. Já o mercado a instrumentaliza, como fez o antigo slogan de uma escola paulistana: “Seja mais de você em você mesmo”.

O objeto desse desejo sem nome, numa abordagem antropológica cristã, identifica-se com a máxima realização possível da própria potencialidade ao amor ou, em linguagem teológica, salvação. Trata-se do desejo de Deus (cf. Catecismo da Igreja Católica nº 27), que implica na busca espiritual.

Tal busca é um caminho árduo, pois consiste em aprender a amar. Isso supõe a possibilidade de frustração. E o amadurecimento da pessoa para o amor exige tanto consciência como aceitação das frustrações. Mas se o adulto comum conhece a possibilidade do não, nem sempre aprendeu a aceitá-lo. O homem e a mulher contemporâneos são seres despreparados ante as frustrações — observação essa nada surpreendente numa civilização hedonista como a nossa.

A angústia é a contrapartida possível do desejo. Quando se trata do desejo de salvação, a angústia pode atingir níveis intoleráveis, pois à grandiosidade do objeto corresponde a ameaça de uma imensa frustração. Ao desejo do céu corresponde o medo do inferno. Nosso catequizando adulto é alguém extremamente carente de salvação e, de certa forma, premido pelo terror da negativa — não porque não cumpre as leis, mas porque não ama nem se sente amado.

Por outro lado, a busca espiritual configura-se numa corrida contra o tempo, o grande dispensador de frustrações. Enquanto a criança vê o tempo como ilimitado, o adulto é profundamente marcado pela angústia do tempo-que-passa-e-não-volta-atrás; pela urgência de delinear o rumo da vida antes que o prazo se esgote; pelo medo de não conseguir dar o máximo de si a tempo. Por isso ama os relógios, as agendas e os calendários — dão-lhe a sensação de poder controlar o inimigo. Por isso vê mais alívio na crença na reencarnação do que na ressurreição. Exige respostas rápidas que aliviem a dor de ser adulto e, se possível, devolvam ao mundo o encantamento da infância, a sensação de eternidade.

Se o desejo de salvação é o grande aliado da catequese com adultos, o outro lado da moeda — a angústia do finito — pode acabar sendo também.

Diriam os mestres da vida espiritual que a experiência consciente e aceita da frustração é o caminho para a sua superação. O problema é se os nossos adultos têm feito tal experiência. Se já perceberam que a finitude não está (somente) nos outros, mas neles mesmos. Mais: se acreditam que podem ir além desses limites, saboreando cada instante que passa em seu infinito próprio— entrando assim no “tempo de Deus”. Voltando a ser crianças. Eis a tarefa fundamental da catequese com adultos.

Não se trata de despertar a angústia do finito em quem está quieto, até porque a vida se encarregará disso. Trata-se, prioritariamente, de construir uma catequese profundamente conectada à busca espiritual do adulto de hoje. É possível dizer-lhe o que busca — aquela realidade que Jesus chamou Reinado de Deus, mas a catequese não tem como ir de encontro ao catequizando como troféu na bandeja. A busca pertence ao próprio catequizando. À catequese compete acompanhá-lo e iluminar seu caminho com a Palavra, na certeza de que o que encontrar, seja o que for, é uma face da Salvação.

A religião, assim como a filosofia, nasce do medo. “Se não vier pelo amor, virá pelo temor”, reza um ditado corrente nos meios neopentecostais. Isso é verdade. A explosão do neopentecostalismo se alimenta da angústia do finito — a outra face do desejo de salvação. As comunidades católicas — por que não dizê-lo? — também. A catequese com adultos não pode ignorar essa que é, talvez, a condição fundamental de seus catequizandos. Mas é verdade que uma catequese autenticamente cristã deve ser capaz de superar essa condição: ela os ensinará a rir do medo.

Temamos somente as falsas respostas que esvaziam a busca. Contra elas deve ser o combate — e não contra a ânsia de autonomia, seja ela mera fuga da frustração, seja face autêntica da maturidade humana e cristã.

 

3. A religião do mercado…

Uma das falsas respostas a temer é aquela que ganhou terreno considerável na mentalidade contemporânea: a identificação entre consumo e salvação.

Nessa era de domínio aparentemente pleno do deus Mamom — o deus dinheiro — o religioso parece ter sido reconfigurado de acordo com o novo dogma: a salvação pessoal (não cabe aqui falar da humanidade) acontecerá mediante a livre concorrência, pois está radicada no máximo consumo possível. Alimenta-se do clássico dogma da retribuição: os bons vão aos shoppings, aos paraísos fiscais e ao ecoturismo, enquanto os maus vão à cadeia, à Febem, às escolas e aos hospitais públicos. A ética da Qualidade Total substitui a ética do evangelho. Do maior amor à maior competição possível.

A grande Virtude é atingir o máximo lucro financeiro para consumir o máximo no menor tempo possível. Como a Virtude não está ao alcance de todos, a maioria simplesmente suspira por alcançá-la. Realiza-a no plano da fantasia. O consumo é a única coisa que pode preencher o vazio no coração de seus fiéis; torna-se o objeto da busca espiritual.

Mas, o fim dos tempos está próximo: será o Mercado Total. O Juízo sobre as contas correntes separará os cabritos dos cordeiros. Os que ousaram adiar o fim das utopias socialistas verão a segunda morte. Os que tudo deixaram para se ajustar perfeitamente ao Mercado terão a bem-aventurança eterna, num mundo purificado das massas sobrantes, eliminadas definitivamente pela própria preguiça, ignorância e vício.

É esse, segundo ampla corrente de teólogos contemporâneos, o clima religioso que permeou a escalada da doutrina neoliberal nos países desenvolvidos (onde já está caindo em descrédito) e, agora, ganha fôlego nos países em desenvolvimento. O curioso é que esse clima religioso preencheu um vazio deixado pela catequese cristã; ressignificou o arcabouço dogmático que a catequese ofereceu esvaziado, desvinculado da existência concreta do catequizando adulto, como se fosse algo com sentido em si mesmo. Evidentemente tal ressignificação aconteceu num nível não racional, porém seus efeitos atingem, na doutrina do neoliberalismo, uma racionalização assustadora e difícil de desbaratar.

Em resumo, o mercado está oferecendo uma resposta religiosa ao desejo de salvação. No sentido etimológico da palavra: é preciso religar-se ao mercado para estar salvo — melhor dizendo, a salvo de sua ira.

 

4. … E o mercado da religião!

Por sua vez, a resposta do mercado interfere na resposta “propriamente” religiosa. Não só o consumo é identificado com a salvação — ela própria tem sido oferecida como produto de consumo. Ganha custo financeiro e condições facilitadas de pagamento. Afinal, neste mundo só tem valor o que tem preço —no mercado, o que é de graça está vencido, estragado ou obsoleto.

Não será fácil, nessas condições, convencer as pessoas de que não podem obter a salvação simples­mente pela compra de sacramentos; que a catequese é mais do, que um passaporte para o matrimônio; ou que não pode existir catequese-relâmpago para adultos “inadimplentes” com a fé, que vão precisar mesmo “gastar” mais tempo do que estariam dispostos. Será difícil até porque a pastoral dos sacramentos e a catequese, com sua prática conjunta de “cursinhos”, reforçam continuamente essa compreensão das coisas por parte dos catequizandos adultos.

Pior, talvez, será convencer os marqueteiros religiosos de que a igreja não é um shopping center e que a pregação não é propaganda. Que a catequese com adultos não é demonstração de produto. Afinal, o catequista jamais poderá dizer: “Satisfação garantida ou seu tempo de volta”, porque a catequese não está aí para satisfazer, mas para questionar tantas satisfações vazias que nos impedem de ver o Outro.

A solução encontrada até agora foi a fórmula cursinho (de noivos, de batismo…), que quase sempre passa longe de uma experiência de fé em comunidade. Com isso, a catequese com adultos vê-se impelida a entrar nos critérios do mercado. Assim como nos supletivos, nos cursinhos pré-vestibulares e em alguns cursos via internet, o importante é a aprovação ou “diploma” rápido e fácil, e não o aprendizado no decorrer do processo (até porque o computador está aí para reter informações no lugar da pessoa). O que vale para os clientes de tal catequese não é tanto a experiência vital, mas é a coisa que vem rápido para suas mãos. De acordo com essa lógica, se a catequese não se tornar competitiva, ou seja, mais compensadora do que outros passatempos, não valerá o tempo despendido pelos adultos. Em outras palavras, a catequese de iniciação de adultos deverá ser rápida, prática, divertida, de baixo custo financeiro e, de preferência, não deverá perturbar o conteúdo que o mercado atribuiu aos dogmas que encontrara esvaziados.

O interessante é que nem mesmo a catequese-cursinho está dando conta de captar o interesse dos adultos. Será que, assim como surgiram os personal-trainners, surgirão os personal-catequistas?

Certos aspectos do itinerário catequético são irrenunciáveis. Um deles é justamente a necessidade de tempo. Não é possível completar uma busca espiritual autêntica em algumas horas. Por menor que seja, o itinerário nunca durará menos do que todo o tempo de vida que resta ao catequizando! Como a catequese quer do adulto justamente esse que é seu capital mais valioso, a negociação pode ser árdua. Muitos realmente pagariam pela salvação se o seu tempo pudesse ser poupado. Afinal, “tempo é dinheiro”.

A catequese de adultos lida diretamente com tais desafios. Como fazê-lo? Em primeiro lugar, deverá desfazer os mal-entendidos: libertar o tempo dessa fusão de identidade com o valor monetário; desvincular consumo e salvação; e, principalmente, desfazer o mal-entendido que transformou a salvação numa mercadoria. Será uma catequese na contracorrente do mercado religioso, com a tarefa fundamental de comunicar a originalidade da proposta cristã, o significado da salvação.

 

5. A questão da linguagem

Na catequese, não só o que se diz é importante. O como se diz é tão importante quanto o conteúdo. O problema da linguagem é crucial e não se reduz a mera questão de vocabulário. A linguagem é a expressão global do indivíduo/da cultura; é interação da fala, do gesto, do tipo de argumentação, da expressão corporal; habilidade em ligar conceitos à mentalidade do interlocutor; coerência entre falar e agir. Não pode ser a mesma em contextos distintos, pois se configura sempre numa via de mão dupla.

Qual linguagem seria, então, adequada à catequese com adultos? A resposta se dá numa nova questão: com quais adultos? A quem se dirige? No mundo contemporâneo é um risco desmedido tentar traçar diretrizes muito amplas: o adulto é isso, o adulto entende aquilo… Essa questão só encontra caminhos de superação à medida que o catequista é capaz de ouvir o catequizando. Assim é possível conhecer o seu padrão mental e entrar nele, comunicando-lhe a partir de dentro a notícia da salvação. Em outras palavras, é preciso aprender a usar a própria linguagem do catequizando.

Ouvir tem se tornado um conhecimento especializado, de difícil acesso na era da imagem e do som; o catequista precisa ser educado para tanto. Os meios serão variados: subsídios, experiências vitais, dinâmicas de grupo, oficinas. Silêncio. Abertura irrestrita à compreensão das linguagens que habitam o mundo do catequizando.

Não se pode esperar muito da linguagem de subsídios e manuais. Os que já existem quase sempre estão presos ao tradicional jargão da catequese infantil, tomado em grande parte dos antigos catecismos e das histórias sagradas, misturado a sofisticados termos da teologia recolhidos aqui e ali. Em suma, mistura-se o que se tem na gaveta e na memória.

A solução não está na gaveta. O catequista deve aprender a se expressar dentro dos recursos, do catequizando, para, num segundo momento, ajudar a ampliá-los com a riqueza da Palavra é da Tradição. Porém, mesmo essas não podem ser entregues prontas. Precisam ser partidas, mastigadas, digeridas, absorvidas, para se transformarem na energia vital que sustentará a educação do adulto na fé e para a fé.

O Catecismo da Igreja Católica não é um manual para catequese de iniciação com adultos, como não o são os livros de catequese para crianças e adolescentes, e também não o é todo e qualquer texto bíblico. Tudo isso é material para o catequista — mas nem tudo para o catequizando. Tendo claro o que pretende comunicar — a Boa Notícia do Reino de Deus, a salvação, o Deus-Conosco —, o grupo de catequistas deverá reinventar a linguagem a ser usada na catequese com adultos, na certeza de que assume uma atividade pioneira.

É preciso mencionar dois perigos, para evitá-los. Um é o da linguagem apologética: Ceder ao medo da alteridade, transformando a catequese numa argumentação sem fim contra as chamadas “acusações dos crentes”. Fazer de questões como a virgindade de Maria e a legitimidade apostólica do papa o conteúdo principal da catequese. Enaltecer a Igreja sublinhando ao máximo suas qualidades e disfarçando seus limites. O outro perigo é a linguagem infantilizada. Há poucos catequistas preparados para descobrir as linguagens próprias do mundo dos adultos. São preparados em certo tipo de linguagem infantil que, na atual era virtual, sequer despertam o interesse das crianças. Aqui fica mais clara do que nunca a necessidade de catequistas adultos, no sentido psicológico do termo, e de uma catequese adulta.

 

6. O mercado da religião (II)

O desafio da linguagem continua quando nos damos conta da importância dos meios de comunicação “católicos”, em especial no processo de formação permanente para o cristão adulto. Desde o início a intenção dos canais de TV católicos tem sido justamente a de atingir católicos nominais, afastados da vida comunitária e da catequese. O problema é que, em vez de usar a linguagem da TV na evangelização, alguns acabam usando a linguagem da “evangelização” na TV. Tornam-se apologéticos. Por isso, a um público “afastado”, minimamente crítico, a linguagem soa distante e a mensagem absurda.

Em algumas situações, a programação não passa de uma reedição do mercado da fé: shows evangelísticos, propaganda de objetos devocionais, exorcismos disfarçados, hábitos, batinas, paramentos fulgurantes, tudo o que dê ao telespectador a sensação de estar em contato com o sagrado; ou que dê segurança ao católico que se sente ameaçado em sua fé, reforçando a sensação de pertença eclesial. “Sou feliz por ser católico”, dirá, embora tenha ele uma concepção não muito católica sobre o que signifique ser católico ou mesmo cristão.

Costuma-se afirmar: “papel aceita tudo”. O motivo desse ditado é que o escrito — o radiodifundido, o televisionado — goza de uma credibilidade que pode se transformar em credulidade. A telecatequese tem uma força extraordinária entre o crescente público angariado entre os católicos afastados. Sem uma crítica persistente à sua linguagem e aos seus conteúdos, pouco conseguirá avançar a autêntica catequese comunitária com adultos.

Aí se insere o desafio relativo ao conteúdo moral. Além de operar a redução da moral cristã a um aspecto particular, qual seja, a vida sexual e familiar — na contracorrente do Magistério e da teologia moral do século XX — certas telecatequeses fazem a leitura mais restrita possível dos critérios evangélicos para a vida afetiva do cristão. Convertem a Boa Notícia numa camisa de força, num preço a se pagar pela salvação da ira divina. Aqui me reporto ao início deste artigo, quando citei um caso real de destruição de vida familiar em nome de valores pseudoevangélicos. Efetivamente, a convicção por parte de adultos católicos de que podem tomar decisões a respeito da própria conduta sexual ainda é vista como o problema fundamental por muitas formas de telecatequese. E, no entanto, a catequese cristã com adultos valoriza a autonomia moral como sinal de maturidade cristã.

 

7. Em resumo

Para uma prática eficaz de catequese com adultos, é preciso identificar minimamente os desafios que hoje se nos apresentam. Primeiro, perceber que o grande problema não é a moral privada do catequizando em potencial. Segundo, dar o devido destaque à questão da busca espiritual, movida pelo desejo de salvação e pela angústia da negativa, que efetivamente levará o adulto a se tornar um autêntico catequizando. Terceiro, acusar as falsas respostas à busca, entre outras, da religião do mercado e do mercado da religião. Quarto, partir em busca da linguagem adequada a cada catequizando adulto, evitando os perigos da infantilização e, principalmente, da apologética. Quinto, provocar a crítica daquelas telecatequeses que atendem à angústia do poder ameaçado e, com isso, esvaziam a Boa Notícia da Salvação.

Mais que um programa audacioso, é um programa possível e necessário. Que a formação dos catequistas com adultos seja capaz de assumir tais desafios, na certeza de que, com isso, estará capacitando a catequese para um diálogo autêntico e mutuamente enriquecedor com o catequizando.

Maria Paula Rodrigues