Roteiros homiléticos

Publicado em maio-junho de 2025 - ano 66 - número 363 - pp. 37-40

11 de maio – 4º DOMINGO DA PÁSCOA

Por Pe. Francisco Cornélio*

Escutar e seguir Jesus, o Pastor que dá vida

I. Introdução geral

No 4º domingo da Páscoa, sempre se lê um trecho do capítulo 10 do Evangelho de João, no qual Jesus se define como o Bom Pastor, contrapondo-se à classe dirigente de Jerusalém, que tinha se tornado uma casta de mercenários. Por isso, este dia ficou conhecido como o domingo do Bom Pastor e, oportunamente, no ano de 1964, o papa São Paulo VI o instituiu como o Dia Mundial de Oração pelas Vocações.

Devido às suas origens ligadas à vida pastoril, o povo de Israel sempre atribuiu grande importância à imagem do pastor, aplicando-a a Deus, em primeiro lugar, e depois a todas as pessoas que exerciam liderança, tanto religiosa quanto política. No Novo Testamento, ela é aplicada exclusivamente a Jesus. A liturgia deste domingo é toda marcada por essa imagem. Na primeira leitura, a referência é menos explícita, mas a experiência missionária de Paulo e Barnabé mostra as consequências do seguimento e da escuta da voz do Bom Pastor. Na segunda, Jesus ressuscitado é apresentado como o Cordeiro e Pastor que conduz a humanidade à vida em plenitude. O Evangelho mostra a qualidade do pastoreio de Jesus: ele é o pastor que dá vida, protege e mantém relação de confiança e conhecimento recíprocos com as ovelhas. O salmo é uma proclamação cantada do pastoreio de Deus sobre toda a terra.

II. Comentários dos textos bíblicos

1. I leitura (At 13,14.43-52)

Tirada dos Atos dos Apóstolos, a leitura faz parte da seção dedicada à primeira viagem missionária de Paulo, acompanhado de Barnabé (13,1-14,28). É um momento importante para a vida da Igreja nascente; quer dizer que o anúncio do Evangelho já rompeu os limites geográficos da Palestina e começou a espalhar-se pelo vasto território do Império Romano. Isso significa que o mandato do Ressuscitado está sendo cumprido e o Evangelho está a caminho dos “confins da terra” (At 1,8).

O texto lido relata a experiência dos dois missionários na cidade de Antioquia da Pisídia, na Ásia Menor. O autor descreve o método missionário de Paulo: ao chegar a uma cidade, ele se dirigia inicialmente à sinagoga (v. 14), para anunciar o Evangelho primeiro aos judeus; após ser rejeitado pelos judeus é que se dirigia aos pagãos (v. 46). Apesar de saltar os versículos que contêm a primeira pregação de Paulo na cidade (At 13,15-41), a leitura mostra seus efeitos: a adesão de muitos judeus e simpatizantes (v. 43), e a curiosidade de quase toda a cidade, que se reuniu no sábado seguinte para ouvir o anúncio (v. 44). Isso gerou inveja e oposição nos judeus e, consequentemente, perseguição aos missionários (v. 45.50).

Em resposta à oposição dos judeus, Paulo e Barnabé direcionam o anúncio aos pagãos (v. 46), justificando a decisão tomada com uma citação do profeta Isaías (Is 49,6), já usada por Lucas no seu Evangelho, para ilustrar a missão do próprio Jesus (Lc 2,32): ser luz para as nações e levar a salvação até os confins da terra (v. 47). Diante do anúncio que lhes é dirigido, os pagãos ficam contentes e abraçam a fé (v. 48). É essa a dinâmica que faz a Palavra do Senhor espalhar-se continuamente (v. 49), pois nada consegue impedir o anúncio; a rejeição de um público faz os pregadores procurarem outros auditórios. Assim, na perspectiva do autor, a perseguição se torna providencial para a universalidade da salvação, pois impede o comodismo dos missionários e faz o Evangelho alcançar novos destinatários.

Obrigados a deixar a cidade devido à perseguição, Paulo e Barnabé cumprem o gesto simbólico de sacudir a poeira dos pés (v. 51), como reprovação àqueles que rejeitaram o Evangelho, conforme Jesus mesmo recomendou (Lc 9,5). O mais importante é que eles saem com a missão cumprida: deixam na cidade uma comunidade de discípulos cheios de alegria e do Espírito Santo (v. 52). Isso prova que, por meio dos seus discípulos missionários, a voz do Bom Pastor é ouvida.

2. II leitura (Ap 7,9.14b-17)

A segunda leitura continua a ser tirada do livro do Apocalipse, cujo título significa “revelação”, ou seja, “tirar o véu” que encobre uma realidade, para torná-la conhecida por meio de uma linguagem cheia de imagens e símbolos, típica do gênero literário apocalíptico. Os destinatários leem a mensagem simbólica como convite à esperança e à resistência, e não como prenúncio de tragédias e catástrofes. O trecho lido nesta liturgia pertence à seção dos “sete selos” (Ap 6,1-8,1), os quais são o lacre do livro que contém o desfecho da história e o destino do mundo. Somente o Cordeiro imolado tem autoridade e capacidade para abrir e revelar o sentido de cada selo e, consequentemente, do livro.

A visão contida no texto proclamado corresponde à parte final do sexto selo (6,12-7,17), o mais importante dos sete, pois trata da redenção do gênero humano. Vê-se uma multidão incontável de gente de toda a terra, com vestes brancas e palmas na mão, diante do trono e do Cordeiro (v. 9). As vestes brancas simbolizam a glória de Deus e a luz da ressurreição; as palmas significam vitória. Trata-se, portanto de uma multidão vitoriosa. É a totalidade dos que passaram pela grande tribulação, resistiram ao mal e lavaram as vestes no sangue do Cordeiro (v. 14b), ou seja, foram salvos pela paixão redentora de Cristo e alcançaram a bem-aventurança definitiva (v. 15). Por isso, já não estão sujeitos aos condicionamentos deste mundo (v. 16). Esse é o destino de quem se mantém fiel ao projeto libertador de Deus num mundo marcado por injustiças.

Em suma, o texto ensina que, apesar dos dramas que marcam a existência, o destino da humanidade é a vida em plenitude, para a qual só o Cordeiro, que também é pastor, pode conduzir (v. 17). Temos aqui uma das definições mais ricas da identidade de Jesus: ele é Cordeiro e o Pastor. Isto garante a qualidade do seu pastoreio: ele se identifica com as ovelhas, conhece a situação de cada uma e, por isso, só ele pode conduzi-las às fontes da água da vida, ou seja, à vida plena, que é o destino do gênero humano.

3. Evangelho (Jo 10,27-30)

Como é sabido, o capítulo 10 do Evangelho de João é marcado pela autoapresentação de Jesus como o Bom Pastor, o único capaz de dar a vida pelas ovelhas. Trata-se de imagem muito significativa, pois, além de revelar traços essenciais da sua identidade, também serve de contraposição e denúncia às lideranças religiosas de Jerusalém, que agiam como mercenários; ao invés de promover a vida e o bem das pessoas, exploravam e oprimiam. Apesar de unitário tematicamente, esse capítulo pode ser dividido em três partes: 1ª) v. 1-21; 2ª) v. 22-39; 3ª) v. 40-42, que correspondem a momentos diferentes. A segunda parte, da qual é tirado o Evangelho desta liturgia, apresenta Jesus no templo de Jerusalém, durante uma festa da Dedicação (Jo 10,22). Na ocasião, ele fora interrogado pelos judeus se era mesmo o Cristo, ou seja, o Messias (Jo 10,24).

À pergunta dos judeus, Jesus não responde com um simples “sim”, mas com argumentos que revelam sua identidade de Messias e autêntico pastor. O texto deste domingo é parte dessa resposta. O texto mostra elementos importantes da qualidade do pastoreio de Jesus e fornece os critérios básicos de pertença ao seu rebanho. Isso é evidenciado logo no primeiro versículo, no qual Jesus fala de sua relação com as ovelhas com base em três verbos fundamentais: escutar, conhecer e seguir (v. 27). Escutar significa dar plena adesão aos seus ensinamentos. Conhecer alguém, na linguagem bíblica, quer dizer amar profundamente, ter intimidade. Por sua vez, seguir, consequência direta da escuta, significa, acima de tudo, assimilar seu estilo de vida, assumindo as mesmas causas e fazendo as mesmas opções que Jesus.

Quem vive a experiência de relacionar-se com Jesus, segundo a dinâmica do escutar-conhecer-seguir, recebe a vida eterna e a garantia de comunhão com ele e com o Pai (v. 28-29). A vida eterna não é uma projeção de futuro, mas começa desde agora. É a condução da existência segundo os valores do Evangelho. É uma vida tão plena e cheia de sentido, que nem a morte pode destruí-la. Quem recebe essa vida pertence definitivamente a Jesus e é protegido pela sua mão e pela mão do Pai. A mão, na linguagem bíblica, é imagem do poder protetor de Deus, da sua força e dos seus cuidados paternos e maternos (Os 11,3; Dt 33,3; Is 43,13; 49,2; Sl 31,6; 95,4; Sb 3,1; Dn 5,23). Essa proteção, no entanto, não significa imunidade a dificuldades e perseguições; é, acima de tudo, comunhão com Jesus e o Pai.

A relação de Jesus com as ovelhas é reflexo de sua intimidade com o Pai (v. 30). Por isso, seu pastoreio é tão autêntico e único, ao contrário dos chefes religiosos de Jerusalém, que exerciam a liderança por meio da dominação e exploração, gerando medo nas pessoas. Com Jesus, a relação é transparente, livre e recíproca. Ele é um pastor companheiro, por isso é capaz de dar a vida pelas ovelhas, que são seus discípulos e discípulas de todos os tempos.

III. Pistas para reflexão

Mostrar a unidade entre os textos, sobretudo a segunda leitura e o Evangelho: a identidade de Jesus como Cordeiro e Pastor, ao mesmo tempo, favorece sua relação com as ovelhas, que são todos os membros da comunidade. Sendo também Cordeiro, ele conhece perfeitamente a condição humana e a situação de cada pessoa em particular. Por isso, podemos confiar nele e contar com sua presença na jornada da vida. Motivar a comunidade a rezar pelas vocações e pelas pessoas que já exercem função pastoral na comunidade, seja como ministro ordenado ou no estado laical.

Pe. Francisco Cornélio*

*é presbítero da diocese de Mossoró-RN. Possui mestrado em Teologia Bíblica pela Pontificia Università San Tommaso D’Aquino – Angelicum (Roma). É licenciado em Filosofia pelo Instituto Salesiano de Filosofia – Insaf (Recife) e bacharel em Teologia pela Universidade Católica de Salvador-BA. É professor de Teologia no Centro Universitário UniCatólica do RN. [email protected]