Carta do editor

marco-abril de 2017

Biomas brasileiros e defesa da vida

Prezados irmãos e irmãs,

Graça e Paz!

No dia em que Pedro Álvares Cabral despontou aqui com suas caravelas, quando ainda não éramos Brasil, pisou nossas areias pensando ter achado o desconhecido, o desabitado, o sem dono. Ocorre que estava invadindo território que já tinha donos. E donos ilustres. O povo Tupinambá, por exemplo, que habitavam as margens do rio São Francisco, são descritos na historiografia como o povo tupi por excelência; eram homens preparados para a guerra, de estilo de vida luxuoso e cultura sofisticada. Isso para dizer que o europeu não encontrou uma gente perdida, desterrada, sem alma, sem nada.

Não há consenso, mas é possível dizer que, quando os portugueses chegaram à Bahia, os índios brasileiros somavam mais de 2 milhões. Alguns autores asseguram que na época a população indígena era de três milhões ou mais. Foram dizimados por gripe, sarampo, varíola e outras doenças. Escravizados aos milhares e sistematicamente exterminados pelas guerras entre as tribos e, sobretudo, pelo avanço da chamada civilização. Hoje não passam de 325.652. Mesmo assim, há ainda 215 nações e 170 línguas diferentes. Há pelo menos 50 grupos que jamais mantiveram contato com o homem branco, 41 dos quais nem sequer se sabe onde vivem.

Na carta de Pero Vaz de Caminha, escrita em 1500, considerada a certidão de nascimento do Brasil, consta uma descrição rica e pitoresca do encontro do colonizador com a exuberância da natureza e com os tipos humanos daqui.

Na narrativa de Caminha é possível notar que os indígenas, à primeira vista, tiveram uma reação de acolhida, evidentemente sem entender nem prever o que viria a ser a chegada daqueles homens diferentes vindos através do mar. “Andavam já mais mansos e seguros entre nós do que nós andávamos entre eles”, anota o cronista. Pelo número, poderiam ter reagido, se soubessem tratar-se de uma invasão: “Andariam na praia, quando saímos, oito ou dez deles; e de aí a pouco começaram a vir mais. E parece-me que viriam, este dia, à praia quatrocentos e cinquenta”, lembra Caminha.

O autor por mais de uma vez se refere a uma gente inocente e boa: “Porque, certo, essa gente é boa e de boa simplicidade”. Daí o que depois se cunhou chamar de “bom selvagem”. Trata-se também de uma gente bela que não daria trabalho: “Imprimir-se-á ligeiramente neles qualquer cunho que lhes quiserem dar. E, pois, Nosso Senhor, que lhes deu bons corpos e bons rostos, como a bons homens, por aqui não nos trouxe, creio que não foi sem causa”.

Ocorre que, desde o início, a visão do colonizador foi no sentido de explorar a terra e os nativos. Passou longe a dimensão do cuidado. No afã de dominar e na sede pelo progresso, escravizaram as gentes, ensanguentaram a terra, sujaram os rios, mataram os peixes, envenenaram as águas, pisotearam as formigas, desfizeram os ninhos dos pássaros. Faltou o hino das criaturas contemplando a fauna, a flora, a pluralidade dos povos.

Desgraçadamente, a ideia vigente de desenvolvimento e o tão propalado agronegócio, por exemplo, estão espezinhando a criação e levando o mundo ao colapso. Não é necessário muito para viver. É preciso aprender com os antigos: não apenas prover-se dos bens da natureza, mas se irmanar a ela.

É urgente que voltemos a aprender a contemplar a natureza, sentir o pulsar da terra. Pisar o chão olhando as estrelas. O homem não é senhor de nada. Ele é parte de um grande elo que envolve toda a criação. Só Deus é o Senhor. O ser humano é criatura e precisa aprender com as outras criaturas.

Pe. Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp

Editor