Roteiros homiléticos
EM JESUS DEUS REALIZA SUAS PROMESSAS
I. INTRODUÇÃO GERAL
As leituras de hoje estão todas orientadas para o nascimento de Jesus, o Filho de Deus, e para seu papel fundamental na história da salvação que é o poder de ressuscitar os seres humanos, dando-lhes a vida plena.
Além de ser Filho de Deus, Jesus também é verdadeiramente humano, descendente de Davi e em continuidade com os grandes vultos do Antigo Testamento. A fragilidade com que entrou neste mundo foi protegida pela docilidade de José e de Maria, justos e herdeiros das promessas feitas ao povo de Israel.
II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. Evangelho (Mt 1,18-24): Deus conosco, Emanuel
Mateus descreve o processo do nascimento de Jesus Cristo com ênfase em sua origem divina. Ao empregar a palavra “gênesis”, termo grego que aqui se traduz por nascimento (1,18), o evangelista se refere ao começo de algo radicalmente novo, nunca acontecido antes na história.
Em seu relato do nascimento de Jesus, Mateus estabelece dois fatos de suma importância: “nasceu da virgem Maria” e “foi concebido pelo poder do Espírito Santo”. Tudo isso em cumprimento da profecia das Escrituras (1,22).
A origem divina se estabelece principalmente por duas expressões: concebido do Espírito Santo (1,18. 20b) e Emanuel (1,23). A primeira expressão fala da intervenção e participação direta de Deus na concepção. É uma intervenção única da parte de Deus na história da humanidade. Nenhum outro ser nascido de mulher teve tal relação com Deus.
Esse menino que nasceria de Maria seria chamado Emanuel (v. 23), um termo composto que quer dizer “Deus conosco” (v. 24). Em hebraico, esse título significava que a pessoa era representante do Senhor, ou seja, que através do Emanuel, Deus estava com o povo. Jesus Cristo é a revelação suprema de Deus, que agora se apresenta no meio de seu povo como ser visível, palpável.
O nome de Jesus é o mesmo que o de Josué em hebraico e significa “salvador”. Esse menino será um agente de salvação, como o foi Josué no passado. Porém, a salvação trazida por Jesus não se limita a vencer os inimigos externos, como no caso de Josué. Em Jesus, o povo será salvo de seus pecados e reconduzido a Deus de forma definitiva.
Com o nascimento de Jesus se inicia a era messiânica de salvação na qual se concentrava a expectativa de todo o Antigo Testamento. A era messiânica começa com o nascimento de um menino, e nisso consiste a menção ao texto de Isaías. Jesus realiza a presença de Deus no meio de seu povo de maneira completamente nova.
O dilema de José, para o qual o texto chama a atenção, significa que é difícil compreender a ação de Deus, mas o justo permanece fiel mesmo quando não entende os propósitos divinos por trás dos acontecimentos. A presença de Deus no mundo também depende da colaboração humana. Por meio do sim de José e de Maria, realiza-se a promessa de Deus feita a Davi e aos seus descendentes através do profeta Natan (2Sm 7,12-16).
2. I Leitura (Is 7,10-14): o sinal do Emanuel
A união de dois países, Haram e Israel do Norte, contra o reino de Judá havia colocado Acaz, o rei judaíta, numa situação difícil, pois os adversários pretendiam depô-lo do trono e substituí-lo por um príncipe inimigo. Semelhante acontecimento significaria o cancelamento de uma promessa feita a Davi, antepassado de Acaz, por intermédio do profeta Natan (2Sm 7,12-16).
Isaías foi ao encontro do rei para lhe assegurar que a promessa estava em vigor e, portanto, Acaz não perderia o trono. Um sinal foi oferecido ao rei para assegurá-lo de que a coroa permaneceria com um descendente dele. Um sinal de Deus, tanto no Antigo Testamento quanto no Novo, é um acontecimento que dá ao ser humano a certeza de uma intervenção divina. Nesse caso, o sinal confirmaria a mensagem de Deus a Acaz por intermédio do profeta.
As esperanças de bem-estar para o reino de Judá dependiam de um sucessor davídico no trono. Por isso o sinal dado por Deus é o nascimento de um menino, filho do rei, que herdará o trono. O herdeiro de Acaz foi Ezequias, cujo nascimento foi um sinal da presença de Deus no meio do povo e da renovação das promessas feitas a Davi.
Contudo, a solenidade do título Emanuel, dado ao menino pela profecia de Isaías, despertou a fé de que no futuro surgiria outro descendente de Davi em cuja vida se poderia manifestar completa e definitivamente a presença de Deus entre o povo. Isaías expressou uma esperança que chegou à sua plena realização em Cristo. A Igreja primitiva viu no nascimento de Jesus o pleno cumprimento da profecia sobre o Emanuel.
3. II Leitura (Rm 1,1-7): descendente de Davi e Filho de Deus
Paulo intitula-se como servo de Cristo, assinalando que está a serviço do evangelho. O Antigo Testamento emprega a expressão “servo do Senhor” para descrever as grandes figuras da história da salvação como Abraão (Sl 105,42), Moisés (2Rs 18,12), Josué (Js 2,8) etc. Paulo se situa na mesma linha desses personagens, sublinhando a origem divina de seu apostolado.
Paulo entende seu chamado em continuidade com a vocação daquelas figuras do Antigo Testamento. Conforme a teologia do Apóstolo, profetas seriam todos os personagens do Antigo Testamento cujas palavras ele julgava serem aplicáveis a Cristo.
O evangelho proclamado por Paulo faz parte do propósito eterno de Deus no qual também o Antigo Testamento está incluído. As promessas divinas no passado se referem a Jesus, filho de Davi na ordem da descendência natural, mas que possui uma qualidade muito maior a de ser Filho de Deus.
Ao empregar a expressão “Filho de Deus com poder”, Paulo evoca a relação singular de Jesus com o Pai na história da salvação. Cristo foi investido no poder de vivificar o ser humano, ou seja, de dar à humanidade a vida plena, a ressurreição.
III. PISTAS PARA REFLEXÃO
A liturgia celebra o mistério de Jesus distribuindo-o ao longo do ano litúrgico para que a Igreja possa celebrar esses momentos fortes de sua fé em consonância com a própria dinâmica da vida. Mas não podemos esquecer que a encarnação, morte e ressurreição de Jesus são partes de um mesmo mistério. Natal e Páscoa mutuamente se iluminam. O Filho de Deus entrou no mundo, tocou o ser humano naquilo que tem de mais íntimo: sua orientação fundamental para Aquele que o criou.
Como homem, viveu sua humanidade na radicalidade do amor a Deus, o Pai. Na vivência desse amor, foi perseguido e entregou sua vida por amor. Tal entrega total da vida que culminou na morte, teve uma resposta definitiva de Deus: a ressurreição. Dessa forma, Cristo abriu o caminho da salvação, da vida plena. Com sua ressurreição, cada ser humano é vivificado por Cristo. Então, somente o Natal não basta, é necessário compreender e valorizar a Páscoa.
Aíla Luzia Pinheiro Andrade
Graduada em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará e em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje - BH), onde também cursou mestrado e doutorado em Teologia Bíblica e lecionou por alguns anos. Atualmente, leciona na Faculdade Católica de Fortaleza. É autora do livro Eis que faço novas todas as coisas – teologia apocalíptica (Paulinas). E-mail: [email protected].